Pular para o conteúdo principal

Iaiá Garcia – Romance de Machado de Assis

Detalhe da capa da edição do livro na famosa Coleção Saraiva

Iaiá Garcia foi o quarto romance de Machado de Assis, publicado em 1878, o último de sua fase romântica. Foi originalmente publicado em folhetins no jornal O Cruzeiro. A trama se passa no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, durante as últimas décadas do segundo reinado. No enredo, ocupa um lugar de destaque a Guerra do Paraguai, maior conflito armado entre nações da América-Latina, no qual se envolveu o Brasil. Machado utiliza-se da aceitação do romance para fazer suaves – ou nem tão suaves – críticas ao conflito bélico que fortaleceu o exército brasileiro.

Personagens

- Luís Garcia - funcionário público, viúvo. "Não era frade, mas queria como eles a solidão e o sossego” (Cáp. I).

- Lina (Iaiá Garcia) – A flor do romance, filha de Luís Garcia, menina travessa; possuía os movimentos súbitos e incoerentes da andorinha e a boca desabrochava facilmente em riso (Cáp. I).

- Valéria Gomes - viúva de um desembargador honorário (Cáp. II).

- Jorge – Filho de Valéria e personagem central do enredo.

- Estela – Frequentadora da casa de dona Valéria que depois viria a se tornar madrasta de Iaiá.

- Raimundo - um preto de 50 anos, estatura mediana, forte. Um tipo de africano submisso e delicado. Era escravo e livre ao mesmo tempo (Cáp. I).

- Sr. Antunes – pai de Estela, escrevente e homem de confiança do falecido esposo de Valéria (Cáp. III).

- Eulália - a noiva indesejada de Jorge, 19 anos na certidão de Batismo, 30 no cérebro (Cáp. III).

- Procópio Dias – O nítido retrato do ego masculino.

Após apresentar os três núcleos familiares centrais da trama – o de Luís Garcia, o de dona Valéria e o do Sr. Antunes – Machado conduz o leitor a uma experiência nostálgica de descoberta desconcertada do primeiro amor. Jorge descobre-se cativado por Estela e esta, por sua vez, recusa por princípios o sentimento que também está a descobrir pelo rapaz. Há um beijo, um desprezo e uma partida para a guerra. Jorge foge do seu conflito em direção ao conflito bélico, mas seu amor por Estela não podia ser morto por uma bala. Ao retornar da guerra, reencontra sua amada, já casada com o velho amigo de Dona Valéria, Luís Garcia, homem bom e alheio aos amores juvenis de Jorge.

A jovem filha adolescente de Luís Garcia, a menina Iaiá, rouba a cena. Seu pai adoece e é a vez dela descobrir as alegrias e dores do primeiro amor. Apaixona-se por Jorge, ainda que de início resista. Jorge encontra em Iaiá  correspondência no amor que não encontrara na paixão de sua adolescência. Resta a suspeita da menina Iaiá sobre Jorge e sua madrasta, Estela. O ciúme adolescente será maior do que o primeiro amor? Ou o amor empoeirado que Estela guardou na prateleira será maior do que seus princípios pelos quais um dia disse “não”? Entre os conflitos do coração, por vezes mais mortais que os conflitos bélicos, o ego do macho Procópio Dias também ameaça o feliz desfecho do enredo. Resta ao leitor debruçar-se sobre o romance e penetrar seus descaminhos.

Citações

"Um observador atento podia adivinhar por trás daquela impassibilidade aparente ou contraída as ruínas de um coração desenganado" (Cáp. I).

"Uma onça de paz vale mais que uma libra de vitória" (Cáp. I).

"Se o homem amoldara as coisas a seu jeito, não admira que amoldasse também o homem" (Cáp. I).

"Raimundo olhava para ela, bebendo a felicidade que se lhe entornava dos olhos como um jorro de água pura". (Cáp. I).

"O tempo, esse químico invisível, que dissolve, compõe, extrai e transforma todas as substâncias morais." (Cáp. I).

"Goza por enquanto a vida; mas os dias passam, e a ociosidade faz-se natureza com o tempo" (Valéria sobre Jorge - Cap. II).

"A honra nacional era certamente o colorido nobre e augusto de algum pensamento reservado e menos coletivo" (Cáp. II).

"O coração humano é a região do inesperado" (Cáp. II).

"A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal" (Cáp. III).

"Se morrer, a senhora será o meu último pensamento; se viver, não quero outra glória que não seja a de me sentir amado. Uma e outra coisa dependem só da senhora. Diga-me; devo morrer ou viver?" (Jorge à Estela - Cáp. IV).

"Serve a tua pátria, e lembra-te de tua mãe!" (Cáp. IV).

"Os corações discretos são raros" (Cáp. V).

"Meu amor não sabe já o que seja impaciência ou ciúme ou exclusivismo: é uma fé religiosa, que pode viver inteira em muitos corações" (Cáp. V).

"Não se sentia feliz nem infeliz, mas nesse estado médio, que é a condição vulgar da vida humana" (Cáp. V).

"Proclamações são loterias; a fortuna as faz sublimes ou vãs" (Cáp. VI).

"Distraída... assim, como pessoa que não tem o pensamento sossegado. Não sei se aquilo é paixão ou doença" (Cáp. VI).

"De todas as aves raras, a mais rara é um bom marido; mas o que é raro não é impossível" (Cáp. VI).

"A vida conjugal é tão somente uma crônica; basta-lhe fidelidade e algum estilo" (Cáp. VI).

"Em geral os casamentos começam pelo amor e acabam pela estima; nós começamos pela estima. É muito mais seguro." (Cáp. VI).

"Não se deixe apodrecer na obscuridade, que é a mais fria das sepulturas" (Cáp. VII).

"Talvez lutavam nela forças contrárias; ou era o seu passado que emergia da sombra do tempo, com todas as cores vivas ou escuras, com as delícias ocultas e nunca reveladas, e ao mesmo tempo as amarguras e resistências" (Cáp. X).

"Era o coração que mordia impaciente o freio da necessidade e do orgulho e vinha pedir ainda uma vez o seu quinhão de vida" (Cáp. X).

"Esses dez minutos foram a sua puberdade moral. A criança acabara; principiava a mulher" (Cáp. X).

"Nada se deve imputar aos dementes e aos namorados." (Cáp. XI).

"Virtudes inteiriças são invenções de poetas" (Cáp. XI).

"O professor é o pai intelectual do discípulo" (Cáp. XII).

"Quando estimo alguém, perdoo; quando não estimo, esqueço." (Cáp. XIII).

"Há sensações que o tempo leva para não restituir mais." (Cáp. XIII).

"Penso que o amor verdadeiro, ou ao menos o melhor, é o que não vê nada em volta de si, e caminha direito, resoluto e feliz aonde o leva o coração." (Cáp. XIII).

"Há coisas que se não fazem, outras que se não dizem; algumas ficarão entre mim e Deus." (Cáp. XIII).

"Não se dão conselhos ao coração que ama" (Cáp. XIV).

"Deixaste-te envolver nos fios invisíveis; não sentiste que essa intimidade de todos os dias era a gota d'água que te cavava o coração" (Cáp. XIV).

"Não custa muito uma simples palavra" (Cáp. XIV).

"E a linguagem que a alma não quis confiar do lábio do homem, eles a disseram com os olhos, durante alguns minutos largos" (Cáp. XIV).

"Que noiva receou nunca de um amor antigo, começado e acabado, antes de ela ser amada também?" (Cáp. XIV).

"Quanto ao passado, é como os defuntos; reza-se por eles, quando se reza" (Cáp. XIV).

"O amor persistia no coração, como um mau hóspede" (Cáp. XV).

"O futuro trouxe-a ao presente, o presente levou-a ao passado" (Cáp. XV).

"O silêncio é uma maneira de responder" (Cáp. XV).

"Há dores secas, como há cóleras mudas" (Cáp. XV).

"É duro de ouvir, minha filha, mas não há nada eterno nesse mundo" (Cáp. XVI).

"Alguma coisa escapa ao naufrágio das ilusões" (Cáp. XVII).


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Mão e a Luva - Romance de Machado de Assis

Musical A Mão e a Luva - Teatro Correia Lima (Rio de Janeiro, Brasil) A Mão e a Luva é o segundo romance de Machado de Assis, lançado em 1874 em folhetins de jornal. A história se passa, em sua maior parte, nas chácaras de Botafogo, Rio de Janeiro de meados do século XIX e possui um enredo elegantemente simples, combinando as relações entre seus seis personagens: - Estevão ,  jovem afetuoso e bom  que nascera para amar (Cáp. III), dotado de extremas sensibilidade e fraqueza de ânimo (Cáp. I). - Seu amigo, Luís Alves , que “via bem com os olhos da cara” e sabia reger as afeições a seu próprio interesse (Cáp. I). - A protagonista Guiomar , com seu magnifico par de olhos castanhos (Cáp. I), que traziam uma beleza severa, casta e fria (Cáp. III). - A Baronesa , madrinha que amava Guiomar com amor filial. - Mrs. Oswald , a governanta inglesa da baronesa, mulher inteligente e sagaz, de boa índole e serviçal (Cáp. IV). - Jorge , sobrinho da baronesa, que possuía um amor medido e s